Experiências de “camuflagem” de gênero: pessoas trans e o uso do nome social em uma universidade pública no Centro-Oeste brasileiro

Autores

DOI:

https://doi.org/10.20435/serie-estudos.v27i59.1578

Palavras-chave:

nome social, universidade, reconhecimento

Resumo

Este artigo analisa o uso do nome social por pessoas trans (travestis, transexuais e não binários/as) em uma universidade pública no Centro-Oeste brasileiro. Por meio de entrevistas semiestruturadas e do referencial teórico pós-crítico em Educação, são discutidas as experiências de quatro universitárias em busca do reconhecimento, pelo nome, do gênero com que se identificam. Aponta-se o quanto o nome social torna-se importante, mas não necessariamente resolve todas as dificuldades de acesso e permanência no Ensino Superior. A análise qualitativa dos dados indica as fragilidades legais que instituem o uso do nome social e, ao mesmo tempo, os limites culturais normativos dos processos de produção das identidades de gênero em uma perspectiva pós-identitária, isto é, para além dos sujeitos trans em si. Conclui-se que o uso do nome social compõe um regime de visibilidade de gênero que favorece uma “camuflagem”, permitindo uma certa “vida social”, estrategicamente agenciada em diferentes contextos, especialmente na universidade.

Biografia do Autor

Adriana Cristiane Lopes Lino, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)

Mestra em Estudos Culturais e graduada no Bacharelado em Ciências Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Pesquisa nas áreas de gênero e de sexualidade, identidade/subjetividade. Servidora pública locada na Secretaria Municipal de Educação (SEMED) de Campo Grande, MS.

Tiago Duque, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)

Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Professor no Programa de Pós-Graduação em Educação do Campus Pantanal e na Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Líder do Impróprias – Grupo de Pesquisa em Gênero, Sexualidade e Diferenças. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Referências

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS DIRIGENTES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR [ANDIFES]. V Pesquisa nacional de perfil socioeconômico e cultural de dos(as) graduandos(as) das IFES – 2018. Brasília, DF: FONAPRACE, 2019.

BENTO, B. Nome Social para pessoas trans: cidadania precária e gambiarra legal. Contemporânea, São Carlos, v. 4, n. 1, p. 165-82, 2014.

BENTO, B. O que é transexualidade. São Paulo: Brasiliense, 2017. [E-book].

BONDÍA, J. L. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 19, p. 20-28, 2002.

BRAH, A. Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu, Campinas, n. 26, p. 329-76, 2006.

BRASIL. Projeto de Lei n. 2.578, de 2020. Determina que tanto o sexo biológico como as características sexuais primárias e cromossômicas definem o gênero do indivíduo no Brasil. Brasília. DF: Câmara dos Deputados, 2020.

BRASIL. Provimento 73, de 28 de junho de 2018. Dispõe sobre a averbação da alteração do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento de pessoa transgênero no Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN). Diário Oficial da União: Brasília, DF, 28 jun. 2018.

BRASIL. Portaria 233, de 18 de maio de 2010. Portaria que dispõe sobre a possiblidade do nome social adotado por travestis e transexuais ser utilizado na administração pública federal. Brasília, DF: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 18 maio 2010.

BRASIL. Decreto n. 8.727, de 28 de abril de 2016. Dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 29 abr. 2016.

BRASIL. Lei 9.708/98, de 18 de novembro de 1998. Altera o art. 58 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre Registros Públicos, para possibilitar a substituição do prenome por apelidos públicos notórios. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 18 dez. 1998.

BRASIL. Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República/Casa Civil/Subchefia para assuntos jurídicos, 31 dez. 1973.

BRASIL. Portaria n. 1.612, de 17 de novembro de 2011. Assegurado às pessoas transexuais e travestis o direito à escolha de tratamento nominal nos atos e procedimentos promovidos no âmbito do Ministério da Educação. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 21 nov. 2011.

BRASIL. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.275, de 21 julho de 2009. Direito constitucional e registral. Pessoa transgênero. Alteração do prenome e do sexo no registro civil. Possibilidade de direito ao nome, ao reconhecimento da personalidade jurídica, à liberdade pessoal, à honra e à dignidade. Inexigibilidade de cirurgia de transgenitalização ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes. Brasília, DF: Supremo Tribunal Federal, 21 julho de 2009.

BUTLER, J. Dar cuenta de sí mismo: violencia ética y responsabilidad. Buenos Aires: Amorrortu, 2009.

BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017.

CAMPO GRANDE. Lei Municipal n. 5.527, de 10 de março de 2015. Altera dispositivos da Lei nº 2.909, de 28.07.1992, que institui o Código de Polícia Administrativa do Município de Campo Grande-MS. Diário Oficial de Campo Grande: Campo Grande, MS, 10 mar. 2015.

CANTELLI, A. L.; NOGUEIRA, S. N. B. (Orgs). Nome Social: a ponta do iceberg. Uberlândia: Edição do Autor, 2020.

CORREA, C. M. A. Subjetividades em trânsito: nome social, travestilidades e transexualidades em duas universidades públicas do Sul do Brasil. 379 f. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2017.

DUQUE, T. Corpo de fala e pesquisa: autorreflexões sobre identidade e diferenças. In: NOGUEIRA, G.; MBANDI, N.; TRÓI, M. (Orgs.). Lugar de fala: conexões, aproximações e diferenças. Salvador: Editora Devires, 2020a, p. 71-7.

DUQUE, T. A Epistemologia da passabilidade: dez notas analíticas sobre experiências de (in)visibilidade trans. História Revista, Goiânia, v. 25, n. 3, p. 32-50, 2020b.

FAVERO, S. Cisgeneridades precárias: raça, gênero e sexualidade na contramão da política do relato. Bagoas – Estudos gays: Gêneros e sexualidades, Natal, v. 13, n. 20, 19 jun. 2020.

FERRARI, A.; BEZERRA, C.S.; CASTRO, R. P. Tensões e enfrentamentos na campanha “Libera o meu xixi” e a presença de pessoas trans na universidade. Revista Diversidade e Educação, Porto Alegre, v. 8, n. 2, p. 21-45, 2020.

FURLIN, Neiva. Sujeito e agência no pensamento de Judith Butler: contribuições para a teoria social. Revista Sociedade e Cultura, Goiânia, v. 16, n. 2, p. 395-403, 2013.

GUILHERME, M. L. F. Nome Social é apelido? Diálogos a partir do decreto 8.727/2016 e notícia do jornalismo online. In: LAU, H. D.; SILVEIRA, E. L. (Orgs.). Raça, Gênero e Sexualidade em Perspectivas Discursivas: teorias e análises. São Paulo: Pimenta Cultural, 2019, p. 167-79.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. 12. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2015.

HATJE, L. F.; RIBERIO, P. R. C.; MAGALHÃES, J. C. Trans(formar) o nome: alguns efeitos do nome social e da alteração do nome civil na vida de sujeitos trans. Revista Contexto e Educação, Ijuí, v.34, n. 108, p. 122-43, 2019.

JAYO, E. S.; MENESES, M. Presença travesti e mediação sociocultural nos palcos brasileiros: uma periodização histórica. Revista Extraprensa, São Paulo, v. 11, n. 2, p. 158-74, 2018.

LIMA, F. Corpos, gêneros, sexualidade: políticas de subjetivação. Porto Alegre: Rede UNIDA, 2014.

MARANHÃO FILHO, E. M. A. “Inclusão” de travestis e transexuais através do nome social e mudança de prenome: diálogos iniciais com Karen Schwach e outras fontes. Oralidades, São Paulo, v. 6, n. 11, p. 89-116, 2012.

MATO GROSSO DO SUL. Decreto Estadual n. 13.684, de 12 de julho de 2013. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso do Sul: Campo Grande, MS, 12 jul. 2013.

MEYER, D. E.; PARAÍSO, M. A. Metodologias de pesquisas pós-críticas ou sobre como fazemos nossas investigações. In: MEYER, D. E.; PARAÍSO, M. A. (Orgs). Metodologias de pesquisas pós-críticas em educação. 2. ed. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2014. p. 17-24.

MISKOLCI, R. Desejos digitais: uma análise sociológica da busca por parceiros on-line. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017.

NASCIMENTO, L. C. P. do. Transfeminismo. São Paulo: Jandaíra, 2021.

ORTNER, S. Poder e Projetos: reflexões sobre a agência. In: GROSSI, M. P.; ECKERT, C.; FRY, P. H. (Orgs.). Conferências e diálogos: saberes e práticas antropológicas. Brasília: ABA/Nova Letra, 2007. p. 45-80.

SANTOS, D. B. C. A biopolítica educacional e o governo de corpos transexuais e travestis. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 45, n. 157, p. 630-51, jul./set. 2015.

SANTOS, D.; OLIVEIRA, A. L. M. Trajetórias Transgêneras na Educação de jovens, adultos e idosos: conquista, horizontes e ameaças entre tempos, espaços e sujeitos escolares. Série-Estudos, Campo Grande, v. 24, n. 52, p. 49-75, set./dez., 2019.

SANTOS, M. S.; DIAS, A. F. Narrativas aquendadas: (micro)políticas de negociação estabelecidas por uma estudante trans* no ensino superior. Cadernos de Gênero, Salvador, v. 6, n. 4, p. 136-57, 2020.

SCOTE, F. D.; GARCIA, M. R. V. Trans-formando a universidade: um estudo sobre o acesso e a permanência de pessoas Trans no Ensino Superior. Perspectiva, Florianópolis, v. 38, n. 2, p. 1-25, abr./jun. 2020.

SILVA, F. G. O.; MAIO, E. R. Gabrielly, diferenças e educação das trans no Oeste Paulista. Revista Internacional de Educação Superior, Campinas, v. 7, p. 1-25, 2020.

SILVA, M. R. Direito Universal ao Nome (Manifesto pela Vida II). Revista Brasileira de Estudos da Homocultura, Cuiabá, v. 3, n. 12, p. 208-19, 2020.

SOUZA, K. A. Direito à identidade, personalidade e dignidade das pessoas transexuais no Brasil – nome e sexo/gênero como direitos constitucionais e civis. In: SAMPAIO, F. S.; TAVARES, L. P. T. (Orgs.). Contestando as fronteiras de gênero, raça e sexualidade na sociedade brasileira. Campina Grande: Editora Amplla, p. 164-76, dez. 2020. [E-book].

VIANNA, C. Gênero, sexualidade e políticas públicas de educação: um diálogo com a produção acadêmica. Pro-Posições, Campinas, v. 23, n. 2, p. 127-43, 2012.

VIEIRA, H.; BAGAGLI, B. P. O transfeminismo como resultado histórico das trajetórias feministas. In: HOLANDA, H. B. Explosão feminista: arte, cultura, política e universidade. São Paulo: Companhia das Letras, p. 351-78, 2018.

Downloads

Publicado

2022-05-20

Como Citar

Lino, A. C. L., & Duque, T. (2022). Experiências de “camuflagem” de gênero: pessoas trans e o uso do nome social em uma universidade pública no Centro-Oeste brasileiro. Série-Estudos - Periódico Do Programa De Pós-Graduação Em Educação Da UCDB, 27(59), 261–283. https://doi.org/10.20435/serie-estudos.v27i59.1578

Edição

Seção

Artigos